Fisiologia e Anatomia: O Voo

Quando falamos em voo, pensamos de imediato em aves. Quando as observamos em voo, tudo parece simples, mas para compreendermos os complexos processos envolvidos no voo, temos que recorrer a diversas áreas do conhecimento, algumas delas, aparentemente, bem distantes da biologia.

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Existem vários tipos de voo, dependendo da espécie de ave. No caso das rapinas nocturnas, o voo tem início com o impulso proporcionado pelos poderosos membros posteriores, que dão a propulsão necessária para a frente, acompanhado pelo movimento descendente e antero-posterior dos membros anteriores, as asas, que são estruturas perfeitamente adaptadas ao voo, tanto de um ponto de vista anatómico como aerodinâmico.

Os ossos das aves estão adaptados ao voo, no sentido de que providenciam a força necessária aos movimentos, sem acrescentarem peso substancial à ave. A maioria dos ossos são ocos e preenchidos com ar, de forma a diminuir o peso corporal, facilitando, assim, o voo. Com o mesmo efeito, as aves possuem um sistema respiratório baseado em sacos aéreos, distribuídos pela cavidade toraco-abdominal, com continuidade nalguns ossos pneumáticos, como, por exemplo, o úmero ou o fémur. Os grandes músculos peitorais são também decisivos para os movimentos de asas que permitem o voo e estão inseridos na quilha, o esterno modificado das aves, sendo essa a zona que concentra o maior peso e esforço causado pelo voo, tornando as asas mais leves e manejáveis. No caso das rapinas nocturnas, o esqueleto representa apenas 7% do peso corporal, tornando-as em aves com excelentes capacidades de voo.

Nas rapinas nocturnas, as penas estão adaptadas para um voo totalmente silencioso, para que a presa não escute a aproximação do predador e para que a ave, mesmo durante o voo, consiga escutar os movimentos da presa. A plumagem é extremamente suave, de uma forma geral, com algumas particularidades, como a existência de um bordo formado por delicadas barbas curvadas para cima, nas penas primárias exteriores, que minimizam o som durante o voo (fig. 1).

São três os grupos de penas necessárias ao voo que se encontram nas asas: as penas primárias (as mais exteriores) que são responsáveis pela impulsão e movimentos no ar, durante o bater das asas e no voo planado; as penas secundárias que ajudam a criar a passagem do ar sobre a plumagem, ajudando na elevação durante o voo; e as penas da álula, estrutura correspondente ao polegar de uma mão e que intervém na aterragem, permitindo à ave reduzir a velocidade antes de aterrar, evitando, assim, paragens bruscas. As penas das asas podem alterar constantemente a sua forma, o que permite a alteração de velocidade e, até, pausas momentâneas para planar. Para além das penas das asas, existem outras que contribuem para o voo, como as de revestimento, que proporcionam à ave a suavidade e a aerodinâmica durante o voo e as penas da cauda que servem como um leme, permitindo o ajuste de direcção dos seus movimentos de voo e que têm um importante papel nas manobras aéreas, utilizadas durante a perseguição de presas ou no voo em ambientes com muitos obstáculos.

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Fig. 1 – Pormenor do bordo, nas penas primárias exteriores, formado por barbas curvadas que minimizam o som durante o voo. O ruído da fricção entre as penas é também diminuído pela superfície aveludada existente nestas. (Nota: a foto não apresenta cores reais.)

No que diz respeito aos princípios aerodinâmicos envolvidos no processo do voo, consideram-se relevantes as forças de impulsão e de elevação, o atrito e a gravidade. De uma forma resumida, a ave adquire a capacidade de voo quando a força de elevação iguala a força da gravidade e a força de impulsão iguala o atrito criado pelo corpo da ave. A força de elevação está relacionada com a capacidade que a asa tem para iniciar o voo. Equiparada a um fole, a forma da asa cria uma diferença de pressão de ar entre a superfície dorsal, convexa, e a superfície ventral.

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A superfície dorsal da asa sofre menos pressão por parte do ar que a ventral, uma vez que este passa na primeira a uma velocidade superior. Este fenómeno gera a força de elevação que permite à ave levantar voo. Eventualmente, a velocidade do ar que passa pela asa torna-se rápida, o suficiente, para gerar uma força de elevação que iguala o peso da ave, permitindo a esta manter o voo.

Um facto interessante é que se a velocidade em voo de uma ave duplicar, a força de elevação quadruplica, motivo pelo qual as aves aproveitam o vento para levantar voo, pois este dá uma força de elevação extra, reduzindo assim o esforço necessário. As asas não criam apenas forças de elevação, mas, também, de impulsão, de forma a permitir um voo suficientemente rápido, para criar e manter a elevação.