O bufo-real (Bubo bubo) é o maior estrigídeo europeu. Tem aspecto robusto e compacto, cabeça grande com ‘orelhas’ (ou penachos auriculares) compridas e grandes olhos laranja-avermelhados. As ‘orelhas’, que apenas durante o voo não são visíveis, são mantidas mais erectas quando a ave vocaliza ou é perturbada, e horizontais quando está descontraída ou ansiosa. A plumagem é pardo-amarelada com um aspecto ‘fofo’, uma vez que é muito densa. O disco facial é castanho-acinzentado e as partes superiores são castanhas; o dorso tem manchas e riscas preto-pardacentas. As partes inferiores são maioritariamente castanho-amareladas, o peito largo exibe listras escuras e grossas e o ventre listras mais finas e quase imperceptíveis linhas longitudinais preto-pardacentas. A face inferior das asas é mais clara do que a face superior. Possui tarsos e dedos cobertos de penas com garras preto-acastanhadas e fortes, cuja ponta é mais escura. O bico é preto, e a garganta é branca – quando a ave vocaliza, é possível observar esta característica. Quanto à silhueta de voo, esta destaca-se pela exibição de cabeça comprida, asas longas e bastante largas. A plumagem em ambos os sexos é de cor idêntica; no entanto, a fêmea é maior e mais pesada que o macho.
Em Portugal Continental, ocorre a subespécie B. b. hispanus.

É uma espécie que se distribui desde a Europa Ocidental, Norte de África até à Ásia, onde ocorre até ao sul da Índia e da China; está presente na Península Ibérica, onde se distribui de forma algo fragmentada.
Embora exista de norte a sul de Portugal Continental, não ocorre em grandes áreas do nosso país e é raro na grande maioria do território nacional. É em Trás-os-Montes, nas Beiras interiores, no Alentejo e no nordeste algarvio onde o bufo-real é mais abundante. As bacias dos rios Guadiana, Douro Internacional, Tejo Internacional e as serras do sul são as áreas onde se localizam as melhores e mais contínuas populações desta espécie em Portugal Continental.
Ocupa uma grande variedade de habitats, de florestas de coníferas até áreas desérticas. Parece favorecer habitats rupícolas e evitar florestas de produção. A existência de locais propícios à nidificação, assim como uma adequada disponibilidade de presas, parecem constituir pré-requisitos importantes na escolha de uma área por esta espécie. Ocorre desde o nível do mar até aos 2000 m na Europa, e até aos 4500 m na Ásia Central e nos Himalaias.
Uma vez que se trata de uma ave típica de áreas remotas, demonstra preferência por regiões rochosas montanhosas ou vales escarpados e falésias litorais, com zonas florestais e terrenos abertos e nus, preferindo os últimos para caçar. Para nidificar, aproveita cavidades e fissuras em paredes rochosas ou escarpas e plataformas rochosas em antigas pedreiras. Pode, no entanto, também nidificar em árvores, onde aproveita ninhos de outras grandes aves (e.g. cegonha ou aves de rapina diurnas), velhos e abandonados, ou cavidades. Também nidifica no solo, em caixas-ninho, assim como em edifícios.
A sua alimentação é composta essencialmente por mamíferos de pequeno e médio porte – desde ratos a lebres e carnívoros – e aves; o coelho-bravo é a sua presa mais importante, e a lebre e o ouriço-cacheiro presas frequentes na sua dieta. Ocasionalmente poderá capturar alguns peixes, répteis, anfíbios e artrópodes e alimentar-se de cadáveres. Caça usando várias técnicas diferentes, podendo capturar as presas no solo ou em pleno voo. O bufo-real encontra-se activo maioritariamente do ocaso até à aurora; no período estival pode apresentar alguma actividade crepuscular. Esta espécie apresenta um voo poderoso, estável e silencioso, com bater de asas suave que intercala com períodos em que ‘desliza’, em particular quando voa distâncias maiores.
Espécie monogâmica; o macho e a fêmea constituem um casal permanente, podendo o casal, que demonstra fidelidade ao território, ocupar todos os anos o mesmo ninho ou evidenciar preferência por um ou dois ninhos de todos os presentes no território. Em Portugal, nidifica entre Dezembro e Junho. A postura é, em média, de 2 a 4 ovos e apenas a fêmea os incuba, durante 34 a 36 dias sendo alimentada pelo macho durante este período. As crias, nidícolas, abandonam o ninho ainda sem saberem voar, mas mantêm-se por perto, só aprendendo a voar aos 50-60 dias de idade. Os juvenis tornam-se independentes às 20-24 semanas e atingem a maturidade sexual com 2-3 anos de idade.
Entre as principais ameaças para o bufo-real estão: a destruição e/ou degradação de habitat – sobretudo devido às alterações provocadas pela construção de infra-estruturas, como barragens, parques eólicos e estradas – a perseguição humana, o envenenamento, pilhagem de ninhos e abate ilegal e a colisão e electrocussão em linhas aéreas de distribuição e transporte de energia. Neste aspecto, têm ainda relevância a rarefacção das populações de coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) – em particular derivada das epizootias que esta espécie de lagomorfo tem vindo a sofrer – e o abandono e alteração das práticas tradicionais na pecuária e na agricultura, com impacto sobre as populações de presas desta ave de rapina nocturna.
As medidas de conservação deverão contribuir para a preservação das zonas de nidificação e de alimentação e para a manutenção das populações de bufo-real e poderão passar por: criação de ferramentas de decisão legal acerca da instalação de traçados eléctricos e parques eólicos nas zonas importantes para espécie, desenvolvimento de acções de sensibilização e educação ambiental que versem sobre a temática da conservação das aves de rapina dirigidas a caçadores, guardas e gestores de caça e florestais e para o público em geral, assim como a adopção, e correcta divulgação, de boas práticas na exploração agrícola e florestal, conjugadas com a implementação de medidas de controlo da venda e uso de substâncias tóxicas, implementação de programas de recuperação das populações de coelho-bravo e intensificação das acções de fiscalização. A realização de estudos sobre a bioecologia do bufo-real e a criação de parcerias internacionais com outros programas de conservação poderão constituir também mais-valias, permitindo aumentar o conhecimento sobre a espécie e, assim, facilitar a sua preservação.
Como última nota, convém referir que o bufo-real, vítima de perseguição humana desde tempos antigos, comportamento que se mantém até ao presente, é uma espécie raramente agressiva para com o Homem, apesar do seu tamanho imponente e das garras impressionantes que possui!
• • •
Estatuto de conservação: Mundo (IUCN, 2016): LC (Pouco Preocupante); Europa (BirdLife International, 2004): SPEC 3 (Não concentrada na Europa mas com estatuto de conservação desfavorável); Portugal (Cabral et al., 2005): NT (Quase Ameaçado);
Protecção legal: Convenção de Berna: Anexo II; Convenção de Washington (CITES): Anexo IIA; Directiva Aves: A-I;
Tipo de ocorrência em Portugal Continental: Residente (Res);
Distribuição: Pouco comum;
Dados biométricos: Comprimento: 60 a 75 cm; Envergadura: 160 a 188 cm; Peso: 1500-4600g; Longevidade máxima conhecida na Natureza: 27 anos e 4 meses.
.