Novembro 2016
– Para quem ainda não conhece o Centro de Recuperación para Rapaces Nocturnas – Brinzal, qual o trabalho desenvolvido no centro e os principais objectivos orientadores no desenvolvimento dos vossos projectos e actividades?
A Brinzal é uma associação de defesa do meio-ambiente, sem fins lucrativos, dedicada ao estudo e conservação das aves de rapina nocturnas. Constituída em 1986, a sua actividade principal consiste na reabilitação de fauna selvagem. O Centro de Recuperação de Aves de Rapina Nocturnas Brinzal é o único especializado neste grupo de aves, dentro da Península Ibérica.
Para além do trabalho de recuperação, levam-se a cabo outro tipo de actividades relacionadas com a conservação do meio-ambiente, que vão desde projectos de conservação in situ, até campanhas de sensibilização, passando pela formação, investigação ou educação ambiental.
– Quantas aves acolhe, em média, o centro por ano? Quais as causas de ingresso mais frequentes, no caso das rapinas nocturnas?
O centro acolhe cerca de 1500 animais anualmente, dos quais cerca de 500 pertencem ao grupo das nocturnas.
A causa de ingresso mais frequente corresponde ao que chamamos “volantones”, animais que se encontram durante as primeiras fases de desenvolvimento, mas que começam a explorar o seu entorno, deparando-se com o ser humano. Pensando que estes animais são órfãos, retiram-nos das proximidades do ninho, fazendo-os chegar ao centro de recuperação.
Seguidamente, encontram-se os traumas, sendo, na sua maioria, de origem desconhecida. Dentro dos traumas de origem conhecida, os atropelamentos representam a maior percentagem.
– Como classificariam a adesão, por parte do público em geral, aos projectos Un Mochuelo en cada Olivo e AgroSOStenible 2015, ou a outros projectos semelhantes?
Estes dois projectos têm, por base, conciliar o meio agrícola com a conservação da biodiversidade, fomentando uma agricultura mais sustentável. Assim, os principais implicados no projecto são os agricultores e agricultoras, cuja adesão foi muito positiva. Levando a cabo pequenas medidas, que não afectam a produção agrícola, favorecem a presença de espécies ligadas a este tipo de habitats, que estão em claro declínio.
Os produtos obtidos pelos agricultores que participaram no projecto obtiveram um certificado de sustentabilidade, que foi muito bem aceite pelo público.
– Detectada em 1997, a patologia infecciosa que afecta os Otus scops dos parques de Madrid é, como podemos ler nos vossos comunicados, um problema grave. Existem novos desenvolvimentos sobre este assunto? A suspeita de uma proveniência relacionada com a dieta destas aves foi confirmada? Conseguiram determinar a origem do problema?
Relativamente ao problema que afecta os mochos-d’orelhas, presentes na cidade de Madrid, durante os últimos anos, foram realizados diversos projectos, com o objectivo de descrever a doença, assim como a sua ecologia.
Como resultado destas actividades, sabemos presentemente que o agente responsável pela doença é um parasita nemátode, do género Gongylonema. Assim, demos um nome a esta patologia: Gongylomatose. Este parasita não se encontra descrito em Otus scops, sendo típico de mamíferos, sobretudo ruminantes, e apresenta um ciclo de vida indirecto, em que os seus hospedeiros intermediários são invertebrados coprófagos.
Com esta informação, partimos para outro projecto, cujo objectivo foi identificar qual o hospedeiro intermediário responsável pela transmissão ao mocho-d’orelhas. O resultado foi que a transmissão é feita através da ingestão de baratas (Blatta orientalis), infectadas pelo parasita.
As baratas não se encontram dentro do que se considera uma presa abundante da espécie. Assim, pensamos que a predação destas está baseada na falta de presas mais comuns do mocho-d’orelhas, como podem ser os gafanhotos, grilos, etc., que possuem requerimentos mais especializados, para a sua sobrevivência. Pensamos que os diferentes tipos de trabalhos de manutenção dos parques urbanos, em Madrid, levaram ao desaparecimento deste tipo de invertebrados, ocorrendo apenas aqueles que são mais generalistas, como é o caso das baratas.
Encontramo-nos neste momento a preparar num novo projecto, que consistirá em favorecer a presença de invertebrados nos parques urbanos de Madrid que sejam presas mais naturais do Otus scops, evitando o consumo de baratas, de forma a diminuir a prevalência da doença no ambiente.
– Parece-lhes que a opinião do público em geral tem vindo a mudar relativamente a estas aves, tão envoltas em mitos e superstições que nem sempre lhes são favoráveis? A aceitação e o desejo de proteger as rapinas nocturnas, como resultado das acções de educação e sensibilização ambiental, já são notórios na comunidade madrilena?
Sim, cada ano vemos que a sociedade está cada vez mais implicada na conservação das espécies selvagens. Cada ano, o número de animais que chega ao Brinzal é maior, assim como o número de pedidos de informação, sobretudo porque cada vez mais animais, rapinas nocturnas em particular, começam a habitar ambientes cada vez mais urbanos, como é o caso, por exemplo, do bufo-real.
– Quais entendem ser os principais desafios futuros na conservação das rapinas nocturnas na Península Ibérica? E, mais particularmente, em Madrid?
Pensamos que o principal problema que enfrentam as aves de rapina nocturnas é a perda de habitat. Enquanto há espécies que se adaptam razoavelmente bem a estas alterações, como é o caso do bufo-real, cuja população continua a crescer, uma espécie como a coruja-das-torres, na Comunidade de Madrid, está a sofrer uma diminuição alarmante.
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