©Paulo Alves
(30 de Agosto de 2014, Bogor, Java)
A ilha de Sulawesi é habitada por animais tão estranhos quanto a sua forma contorcida. O Babirusa (Babyrousa babyrussa), um suídeo de aspeto incomum; a Anoa (Bubalus sp.), um pequeno búfalo cujos hábitos são pouco conhecidos, e o Maleo (Macrocephalon maleo), uma ave da família Megapodiidae que enterra os seus ovos em areia quente para depois os abandonar à sua sorte, são apenas alguns exemplos que por si só constituem razões mais que suficientes para querer conhecer melhor este local único.
O número de aves endémicas presentes nesta ilha faz qualquer birdwatcher perder a cabeça…
Neste momento estou a trabalhar, em conjunto com a Burung Indonesia, realizando trabalho de campo em locais estratégicos na área geográfica conhecida como Wallacea – ilustrações para fins científicos e sensibilização ambiental. Acompanhado por uma equipa desta ONG, visitei a província de Gorontalo (Sulawesi Utara) e, durante 4 dias, acampei em Doyong. Grande parte do nosso tempo era passado a registar a avifauna existente neste local.
Quero contar-vos um pequeno episódio:
Doyong, 15 de Agosto de 2014, 18h30
«O dia escureceu cedo. As aves diurnas cessaram a atividade, só um Cacomantis variolosus parece não se ter apercebido. Da floresta, junto ao rio, a silhueta de um Lyncornis macrotis emerge recortada contra o lusco-fusco, soltando um ‘pit-WEEE-oo’ penetrante a cada 3 segundos, lembrando ao cuco que a noite pertence às nocturnas. Registamos o som do noitibó e observamos o seu voo ágil sobre as copas, mas o nosso estômago vazio insiste em lembrar-nos que é altura de acender a fogueira e preparar a ceia. Enquanto saboreamos um belo peixe grelhado, partilhamos as impressões do dia que findou.

Um assobio súbito faz calar-nos. “Celepuk Sulawesi”!!, exclama alguém. Pousado a curta distância do acampamento, um Otus manadensis emite o seu chamamento. Persistentemente conseguimos aproximar-nos da ave e, com a ajuda de uma lanterna, observar este pequeno mocho. Registada a sua vocalização, ficamos a contemplá-lo por algum tempo. O cansaço acaba por se apoderar dos nossos corpos e voltamos ao acampamento, onde adormecemos embalados pelo som melancólico vindo da floresta.»
O Otus manadensis é o único mocho do género Otus presente nesta ilha. Dado o local onde nos encontramos, este exemplar pertencerá à subespécie siaoensis. Difere das outras 5 subespécies reconhecidas atualmente pelo menor tamanho, tufos das orelhas praticamente irreconhecíveis e barrado nas asas e cauda mais estreito. Esta espécie tem como habitat clareiras e orlas de florestas com altos índices de humidade. Pouco se sabe acerca dos seus hábitos alimentares, mas acredita-se que a sua alimentação seja constituída maioritariamente por insectos. Segundo o CITES II, não se encontra ameaçado e aparenta ser relativamente comum em Sulawesi e nas pequenas ilhas adjacentes.
• Otus manadensis: https://soundcloud.com/paulo-alves-65/otus-manadensis
• Lyncornis macrotis: https://soundcloud.com/paulo-alves-65/lyncornis-macrotis.