Comportamento: O Preening

As aves de rapina nocturnas possuem um voo extremamente silencioso. Isto deve-se a três características especiais da sua plumagem: bordo exterior das penas de voo serrilhado, franja no bordo interior das penas de voo e superfície das asas e corpo aveludadas. Estas características têm, como principal função, suprimir o ruído que poderia ser provocado pelo voo.

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Por forma a manterem o seu voo silencioso, não só para não serem detectadas pelas suas presas, como para melhor poderem detectar as mesmas, é necessário que toda a plumagem se mantenha em excelentes condições, sendo isso conseguido através do preening. Esta actividade é bastante importante não só para manter o voo silencioso, no caso das rapinas nocturnas, mas também para que as penas mantenham a sua forma e elasticidade, bem como para eliminar poeiras, sujidades e parasitas que possam ser prejudiciais, tanto para a plumagem como para a própria saúde e bem-estar das aves.

Para auxiliar esta manutenção da plumagem, a maior parte das aves possui uma glândula (ver primeira foto da série de quatro, abaixo) que segrega um óleo rico em ceras, ácidos gordos, gordura e água, sendo este aplicado com o bico (fig. 1). A glândula uropigial (assunto relacionado), como o próprio nome indica, situa-se na zona uropigial, ou seja, no dorso, junto à base da cauda. No caso das rapinas nocturnas, esta glândula é nua ou praticamente nua.

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Fig. 1 – Coruja-do-nabal.

Esta é uma actividade na qual as aves despendem bastante tempo, utilizando para isso o bico e as garras, sendo que, para alcançarem todas as penas do corpo, é comum observarmos as aves em posições não tão usuais. As penas de voo, em particular, são individual e metodicamente percorridas com o bico, desde a base até à ponta, de forma a restaurar a sua integridade.

É também possível observar as aves de rapina nocturnas a realizar determinadas actividades que também fazem parte do preening, como, por exemplo: a alongarem-se e agitarem-se de forma a alinhar as penas (fig. 2) após o preening; a apanhar banhos de sol que as ajudam a controlar os parasitas do corpo e ácaros das penas; a banharem-se em água, normalmente antes do preening, ajudando também a eliminar poeiras, sujidades e parasitas; e mesmo banhos de pó, que ajudam a eliminar parasitas e absorvem o excesso de óleo do preening.

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Fig. 2 – Coruja-das-torres.

Como ferramenta de apoio ao preening, as rapinas nocturnas da família Tytonidae (no caso de Portugal é apenas representada por uma espécie, a coruja-das-torres [Tyto alba]) apresentam o bordo da garra do dedo do meio serrilhada, sendo utilizada principalmente para o preening do disco facial. A manutenção das penas nesta zona é particularmente importante para optimizar a audição das corujas.

Em algumas espécies de aves de rapina nocturnas é possível observar um tipo de comportamento social, no qual uma ave realiza preening a outra. Este comportamento denomina-se allopreening e pensa-se que poderá servir para fortalecer o vínculo entre o casal, sendo mais realizado durante a época reprodutora e, muitas vezes, interligado com a cópula. Em algumas espécies, como o mocho-galego (Athene noctua), e coruja-do-mato (Strix aluco), nas quais o casal poderá manter-se junto durante todo o ano, é realizado o allopreening mesmo fora da época reprodutora. Este comportamento poderá também ser observado entre crias de algumas espécies, como a coruja-das-torres e o mocho-d’orelhas (Otus scops).

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Bibliografia utilizada:

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Cramp S. (ed.) 1985. Handbook of the Birds of Europe the Middle East and North Africa. The Birds of the Western Palearctic Vol. IV, Terns to Woodpeckers. Oxford University Press, Oxford.

Gill F. B. 1995. Ornithology – 2ª ed.. W. H. Freeman and Company, New York.

Martin J. 2008. Barn Owls in Britain. Whittet Books, UK.