Strigiformes e Caprimulgiformes

Os noitibós não pertencem à ordem das rapinas nocturnas; no entanto, são também aves nocturnas e, segundo parece, igualmente ‘condenadas’. Estas aves pousam muitas vezes em estradas, durante a noite, sendo vítimas frequentes de atropelamentos. Ocorrem duas espécies em Portugal Continental, ambas estivais: o noitibó da Europa (fig. 1) e o noitibó-de-nuca-vermelha (fig. seguintes).

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Fig. 1 – Noitibó da Europa (ou noitibó-cinzento).

• Lenda: A Condenação do Noitibó:

«Na mesma histórica jornada, acompanhou, durante muito tempo, os santos Viajantes uma ave de aspecto triste e canto lúgubre, que, voando, voando em pequenos vôos, ia dizendo e repetindo: — “cá vai”, “cá vai”, “cá vai.

E no abominável papel de denunciante, ia indicando a marcha da Sagrada Familia. Depois de a ter ouvido, compreendido e observado por algum tempo, a Virgem Maria disse: “Eu te condeno, vil e abominável ser, a não mais poderes ver a luz do sol, a levares vida solitária e triste pelas sombras, a só voares junto do chão e não mais cruzarás o azul dos céus.” Desde então a noitibó não pode suportar a luz do sol, só sai do seu esconderijo à hora do crepúsculo, não entra no convívio das aves e só voa junto ao chão.» [DIAS, Jaime Lopes. Contos e Lendas da Beira Coimbra, Alma Azul, 2002 , p.47. (Texto utilizado com autorização do CEAO.)]

 

• O chupa-cabras:
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Houve tempos em que as cabras eram os principais fornecedores de leite de muitas famílias. O rebanho era trazido do campo, ao fim da tarde, e as cabras eram então ordenhadas. Mais ou menos à mesma hora, as corujas abandonavam os seus locais de repouso diurno e saíam para caçar (não é novidade, ainda hoje é assim). Nesta caminhada das cabras pelo campo, o ruído das patas e a agitação natural do rebanho causavam um certo desconforto nos ratos – estes movimentavam-se rápida e descuidadamente pelo solo -, o que levava a que fossem facilmente descobertos pelas corujas.

Mas não eram só os ratos a entrar neste alvoroço: os insectos também. Ora, este acontecimento atraía outras aves, também nocturnas, com um particular gosto por estas pequenas criaturas voadoras: os noitibós. Os donos dos rebanhos, confusos, começaram a associar a presença regular destas aves às cabras, achando tratar-se de uma particular atracção pelo leite destas – o que não correspondia, de facto, à realidade. Caçar na companhia das cabras parecia ser, segundo a história, para estas aves, uma forma mais fácil de garantir alimento. E foi assim que as corujas e os noitibós começaram a ser chamados, por muitos agricultores europeus, «chupa-cabras».  Ainda hoje, os noitibós aparecem incluídos na ordem Caprimulgiformes e na família Caprimulgidae (latim para chupa-cabras). Aristóteles utilizava os nomes aegolius (‘parecido-com-cabra’)* e aegotilax (‘chupa-cabra’)** para designar a coruja-das-torres.
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* do inglês: goat-like
**do inglês: goat-sucker
(Owls in Folklore and Natural History, Virginia C. Holmgren.)
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• Um pequeno excerto sobre a relação destas aves (Caprimulgiformes) com as rapinas nocturnas (Strigiformes):

“Sibley & Ahlquist (1990), in their study on DNA-DNA hybridisation, stressed that Caprimulgiformes are the nearest neighbour to the owls, and not falcons. However mtDNA sequences do not support a Strigiformes/Caprimulgiformes clade (Wink & Heidrich 1999). Recently a large dataset of five nuclear genes has provided good evidence that Caprimulgiformes are part of the Metaves, whereas owls are members of the Coronaves (Fain & Houde 2004, Ericson et al., 2006). Within the Coronaves owls are found in a clade with diurnl raptors excluding falcons, which cluster as a sister to parrots and songbirds(…)” (Owls of The World, Claus König and Friedhelm Weick.)