Fisiologia e Anatomia: Audição

Os ouvidos das aves de rapina nocturnas são geralmente de grandes dimensões e bem desenvolvidos, o que lhes permite a detecção de sons que outros animais, incluindo o homem, não conseguem ouvir. No entanto, ao contrário do que se possa pensar, os ouvidos das rapinas nocturnas não são muito mais desenvolvidos do que os do homem, que tem potencial auditivo semelhante, mas possuem adaptações específicas e um conjunto de pormenores anatómicos que conferem capacidades auditivas extraordinárias.

A evolução das estruturas nestas espécies é notável e pode-se considerar que lhes permite ter uma “visão auditiva”, tal é a sua acuidade e a diversidade de vantagens que proporciona, tanto ao nível da obtenção de alimento como até no voo, dada a sua relação com a capacidade de cálculo de distâncias.

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Fig. 1- Diagrama ilustrativo da assimetria existente nos orifícios auditivos de uma coruja-das-torres.

A evolução da audição nas diferentes espécies de rapinas nocturnas está necessariamente relacionada com o ambiente em que se encontram. Assim, verifica-se que, dentro deste grupo, a audição das espécies estritamente nocturnas é mais desenvolvida do que as daquelas que têm actividade diurna, crepuscular ou ao amanhecer. Também é possível constatar que as espécies que frequentam ambientes mais silenciosos, que chegam a caçar sem conseguir ver as presas, ouvem melhor do que as que vivem em habitats mais ricos em sons, como ocorre, por exemplo, nos trópicos.

As capacidades auditivas das rapinas nocturnas não se devem apenas à existência de ouvidos mais sensíveis, mas, principalmente, à combinação de outros factores que, em conjugação, permitem maior capacidade de detecção de sons.

Um factor importante é a presença de um disco facial cujo bordo é formado por penas rígidas que ajudam a direccionar e até a amplificar os sons para os ouvidos, no caso das que estão orientadas caudalmente ou, no que diz respeito às rostrais, que auxiliam a reduzir o ruído, causado pela turbulência durante o voo.

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As próprias penas, para além de terem funções de protecção, podem ainda ter mobilidade conferida por músculos especializados que permitem que a ave se concentre voluntariamente num determinado ponto de origem de um som. Caso as penas do disco facial sofram algum tipo de lesões, as capacidades auditivas da ave não serão as mesmas. À frente do ouvido existe ainda uma porção vertical de pele de controlo voluntário, por parte da ave, o opérculo ou “concha”, que potencia ainda mais a capacidade desta se conseguir focar no som que está a ser encaminhado pelas penas caudais.

.Outro aspecto importante é a assimetria dos orifícios auditivos e das penas envolventes correspondentes (fig. 1). Um dos ouvidos está mais elevado do que o outro, com diferenças de 15º, no máximo, e este aspecto é determinante na capacidade da ave isolar e triangular os sons que recebe. Por outro lado, podem também ocorrer diferentes formas das cavidades auditivas de um lado da cabeça, em relação ao outro, em algumas espécies, o que poderá ser a razão pela qual um dos ouvidos consegue detectar melhor algumas frequências de som do que o outro.

É devido a estes pormenores que as rapinas nocturnas necessitam de constantes movimentos de cabeça, quando se estão a concentrar na origem de determinado som, associando a informação que recebem à que obtêm, também, visualmente, quando isso é possível, nos momentos que antecedem o ataque a uma presa.

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Internamente, a membrana timpânica é de grandes dimensões, no caso das rapinas nocturnas, e é projectada, externamente, ao contrário do que ocorre nos mamíferos; a cóclea, o órgão auditivo, é de maiores dimensões do que nas outras aves. A componente neurológica associada à audição também é relevante, verificando-se que há diferenças significativas entre as várias espécies de aves, no que respeita ao número de células, na parte do cérebro responsável pela audição. Numa ave diurna, como por exemplo, um corvídeo, podem existir 3-4x menos neurónios na área auditiva do cérebro, comparando com uma ave de rapina nocturna, de tamanho semelhante.